meu maior medo, desde a adolescência, é ser estuprada.
hoje passei o dia atendendo mulheres. mulheres entre 15 e 60 e tantos anos. trabalho com mulheres desde que comecei a clinicar. estudo sobre isso, fiz meu TCC sobre violência de gênero e não à toa ele foi intitulado “a (in)visibilidade da violência contra a mulher”. até hoje questiono sua visibilidade.
hoje lembrei que, no dia que meu TCC tomou corpo, tomou corpo também a notícia que uma adolescente de 16 anos tinha sido estuprada por 33 homens. 26 de maio de 2016. naquele dia todas as mulheres ao meu redor perderam um pouco o chão, todas tiveram medo da invasão. também lembrei que durante os 4 primeiros meses de quarentena, os casos de feminicídio cresceram 22%.
ontem, 3 de novembro de 2020, li pela primeira vez o termo “ESTUPRO CULPOSO” e senti um chute no estômago vendo o vídeo da audiência do caso. “eu to implorando por respeito”, disse Mariana Ferrer sendo humilhada por um advogado escroto que tentava usar suas fotos como… fotos como justificativa para que? pra merecer um estupro? lembrei da famosa frase do atual presidente do Brasil tempos atrás.
uma foto não é um convite. um corpo nu não é um convite.
algo sobre ser mulher sempre gritou em mim de um jeito confuso e, há anos, tenho trabalhado para que possa gritar bonito e forte, potente. mas algo sobre as invasões que sofri por ser mulher sempre me causou desconforto. invasões sobre definições de valores, (im)possibilidades, beleza e culpabilizações que passaram pela sociedade e chegaram até mim desde cedo. meu valor determinado pelo meu hímen, atenção à como me sento, como me porto, roupas que uso, com quem ando, horários que saio, lugares que frequento, o que/quanto bebo, palavrões que não deveria falar, número de pessoas com quem transo, meu valor determinado por…? não faço questão de ser a mulher bonita e direita, hoje só faço questão de ser.
sou dona do meu corpo. honro corpo como lar. na minha casa só entra quem e quando eu quero. honro meus desejos e vontades. tenho me curado em vários âmbitos. tenho me cercado de mulheres fodas, tenho honrado minhas ancestrais, tenho me conectado com femininos que não competem, somam. tenho sido cada vez mais atenta, empática. tenho me honrado e tentado, cada vez mais, trabalhar pra que outras mulheres se conectem, assumam seus lugares, desejos, se honrem, se permitam viver, se permitam ser.
tenho me cercado de homens fodas também, mas recentemente tenho atentado mais e mais para a importância do masculino nesse processo. como ainda são poucos os homens que acessam de fato suas potências, afetos, vulnerabilidades, capacidades de acolher, cuidar e somar. e o quanto esses movimentos masculinos e femininos se interferem mutuamente. os últimos tempos só tem me confirmado que isso não é questão de gênero, é questão de humanidade.
“todo mundo tem direito a vida, todo mundo tem direito igual” Lenine tá cantando aqui no fone enquanto escrevo. só consigo me perguntar… será?
como Mariana, eu também to implorando por respeito.
Que texto incrível…
Grata, Amanda ❤